Vivemos tempos em que os modelos difundidos como sendo aqueles que temos de copiar ou seguir para termos sucesso, vivermos melhor, sermos mais felizes são, ou mais longínquos, ou muito exigentes. Exigem uma juventude que é demasiado rápida, uma beleza que espelha um gasto de produção dispendiosa de muitas maneiras, uma atitude de confiança que não se sabe bem onde adquirir, uma inteligência que não se compra em saldos e, genericamente, estilos de vida que parecem ser cada vez menos compatíveis com a realidade que é a nossa.
Tomamos a parte pelo todo num gosto desmesurado de metonímias e conseguimos chegar ao desconforto e à infelicidade quando damos conta que nos afastamos ponto por ponto, em quase tudo, dos modelos que num dado momento abraçámos como nossos, mesmo que sem grande entusiasmo ou convicção.
Refletindo por gosto, distração ou necessidade existencial sobre os processos que nos influenciam e nos tornam alvos, mais ou menos fáceis, desses e doutros modelos que acabam por nos empurrar em escolhas e decisões quase definitivas, chegamos frequentemente a uma zona de inquietante incredulidade sobre a nossa sanidade mental ou sobre a esperteza de que somos dotados.
Quando percebemos que o que somos e quem somos não nos chega e até nos embaraça e nos refugiamos, vezes sem conta, em papéis que pedimos de empréstimos, em gostos que não são nossos ou em escolhas que visam, sobretudo, granjear reconhecimento de conhecidos que não prezamos especialmente ou de audiências imaginárias que, de facto, sabemos que não temos, está na altura de começar de novo.
Começar, ou recomeçar, não exatamente uma busca de outros modelos que sejam menos frustrantes, mas a reconstrução de sentidos próprios que, infelizmente, não nos ensinaram em casa ou na escola nem nos é facilitada por um mundo rápido e pronto a servir, é uma tarefa complicada.
De qualquer modo, se chegarmos a esse momento de necessidade e conseguirmos articular novas perguntas, tudo o que aprendemos, fizemos e sentimos ajuda-nos a chegar a outras respostas. Pelo menos fica a consolação de não sermos um desperdício.