Filme sugerido por Beatriz Cruz
Nas Jornadas Mundiais da Juventude em Lisboa e encontrei um velho amigo: o filme “A Missão”! Encontrei-o na Cidade da Alegria, entre as ruas que assinalavam todas as Jornadas que ocorreram até agora. Não estava à espera da mistura de sentimentos que me despertou …
“A Missão” é um filme de Roland Joffé, com música de Ennio Morricone, que estreou em Portugal a 19 de dezembro de 1986. É um filme bastante antigo, que me marcou pela beleza da fotografia, da banda sonora, da interpretação de atores que admiro bastante, como Jeremy Irons, Robert de Niro e Liam Neeson, mas principalmente pela mensagem transmitida, que se mantém perfeitamente atual. O filme situa-se em 1750, na América do Sul, na altura em que começam as perseguições e a expulsão dos Jesuítas em Portugal. Robert de Niro interpreta Rodrigo Mendoza, um mercenário, traficante de escravos, que mata o irmão em duelo, por ciúmes. Não podendo ser condenado por lei, porque a morte em duelo era legal, fecha-se ao mundo por pensar que o que fizera estava acima do perdão! Jeremy Irons interpreta um padre Jesuíta, o Irmão Gabriel, responsável pela Missão de San Carlos, situada acima das cataratas e em plena selva na América do Sul, que acolhia os índios Guarani. O irmão Gabriel propõe como penitência a Mendoza carregar a armadura e as armas, isto é, tudo o que representava a sua antiga vida, até à Missão, incluindo a subida das cataratas.
Impressionou-me a viagem, mas principalmente a cena em que um dos jesuítas, vendo a dificuldade com que ele subia as cataratas com semelhante carga, e pensando ser suficiente o que fizera até ali, corta a corda que segurava o embrulho, que cai. Impressionou-me a descida de Mendoza, o amarrar de novo a corda, o voltar a subir, sempre em silêncio, sem uma queixa… Comoveu-me a cena em que os índios, tantas vezes perseguidos por ele para serem vendidos como escravos, ao vê-lo e ao que havia sofrido para chegar ali, cortam eles mesmos a corda. Comoveu-me a aceitação de “ser finalmente suficiente”, o choro, os risos e os abraços que acompanham esse “perdão”, essa absolvição. Algum tempo depois, Mendoza torna-se jesuíta. Por esta altura a Missão sai do controlo de Espanha e passa para o de Portugal. É enviado um representante da Igreja às Missões, para decidir se seriam mantidas ou destruídas. A partir daí o filme centra-se em escolhas…
O filme fala do perdão … Não apenas do perdão que pedimos aos outros, mas principalmente daquele perdão que por vezes temos dificuldade em nos conceder por nos considerarmos pouco merecedores… Fala do encerramento em nós mesmos quando esse perdão não ocorre … Fala da generosidade daqueles a quem magoamos e que ainda assim nos ajudam nesse encontro com o perdão … Fala de recomeços, sempre possíveis e sempre a tempo… Fala de felicidade, quando já não a considerávamos possível… E fala também de escolhas… Fala dos vários caminhos que sempre temos à nossa frente… Fala dos argumentos que encontramos para seguir cada um deles… Muitas vezes argumentos pessoais, umas vezes objetivos outras vezes emocionais, e muitas vezes de escolhas sem argumentos concretos, mas apenas confiando… Fala de encontros e desencontros nessa troca de argumentos… Fala de princípios e da dificuldade em os manter face às circunstâncias… Fala da perseverança, fala da amizade, fala da partilha, fala do respeito… E fala, acima de tudo, do Amor! De como a vida só tem sentido no Amor! De como o amor pode servir de desculpa para atalhos… De com o Amor vivido concretamente é difícil, muitas vezes frustrante, angustiante, de como nos faz sentir impotentes face ao Mal… Fala de caminhar no escuro guiado apenas por esta Luz do Amor!
A vida não é simples. Por vezes sentimo-nos cheios de entusiasmo, de alegria, de vontade de iniciar projetos, somos capazes de levar o mundo nos braços… Outras vezes sentimo-nos frustrados, cansados, em sofrimento, desiludidos, injustiçados, atraiçoados, abandonados… Li uma vez que a nossa vida não tem sentido na solidão. Ganha um sentido crescente na medida em que a entregamos a um projeto, a um outro e ao Outro em definitivo. A vida deve ser tudo isto: uma entrega confiante a um Projeto Maior! Um Projeto para os outros e com os outros! A vida tem sentido no exagero da alegria, da esperança, da beleza, da entrega, da partilha, do compromisso, da confiança…A vida deve incluir o outro e dar-lhe importância! A vida deve ser maior do que eu!
O filme fala disto e de muito mais! Traz em si as nossas dúvidas, as nossas escolhas, as nossas certezas, os nossos desesperos, a nossa esperança e a nossa alegria! Fala do que é essencial! E cada um de nós pode descobri-lo ao longo do filme! O filme é antigo, sim. Mas vale a pena redescobri-lo!