Reflexão para o mês de setembro de 2022
“Este é o dia que fez o Senhor: nele exultemos e nos alegremos!” (Salmo 118, 24)
Texto de Ana Luísa Marafona, Comunidade Estrada Clara
Gosto de setembro. Apesar das férias terminarem, dos dias ficarem mais pequenos e das roupas começarem a pesar nos corpos. É o fim da confusão nas ruas da cidade, dos amores de Verão que só duram enquanto o sol brilha, da apatia massificada que inexplicavelmente contagia quem por ela se deixa seduzir. Gosto de setembro. São dias de começos, de inícios, de novidades, de encontros, de agendas, de projetos. É importante marcarmos determinados dias e momentos desde que lhes possamos atribuir um significado de futuro, de perspetiva, de crescimento. Não é pintar esses dias de saudosismos e de lembranças nostálgicas que nos levam a acreditar que o que aconteceu ontem foi o melhor das nossas vidas, mas sim escolher um dia para fazermos escolhas e projetos que nos levem a sermos pessoas mais elevadas. Marcar um dia para lermos um livro, para arrumarmos os nossos armários, para estarmos em silêncio, para combater os amuos e os negativismos. Marcar alguma coisa é para isso mesmo, para marcar! Para nos fazer crescer e evoluir, para nos obrigar a deixar para trás a preguiça e o desânimo, para nos levar a abrir novas janelas. Por vezes, precisamos destas metas traçadas que nos dão força para tomarmos decisões e que nos impelem a caminhar para a frente e a descobrir que podemos ser muito melhores do que aquilo que somos.
Quando tantas vezes se fala em datas, horários, marcações, por vezes pensamos em regras, imposições e obrigações, acarretando assim um significado negativo e nada natural e próprio do que é humano. Acredito que esses dias marcados podem contribuir para o nosso equilíbrio, para o nosso bem-estar e serenidade. Se encaramos esses dias como obrigações, eles, de facto, não passarão disso mesmo… obrigações! Obrigações que por si só nos reprimem, nos limitam e nos enfraquecem. Há sempre a possibilidade de fazermos dias novos, de caminharmos de começo em começo, de irmos de início em início. De deixarmos para trás o que nos amedronta e nos prende ao chão. De deixarmos que apareça a vida inteira que há dentro de cada um de nós.
Por isso, é preciso que esses dias apareçam para exigirem de nós tudo aquilo que podemos dar. Descobrir que em cada ser humano há a possibilidade de recomeçar, de criar, de fazer de novo, de inventar. Enquanto crentes, entendemos que em Deus tudo pode ser novo a cada dia e que nunca nada se esgota ou termina em época alguma. Na história do povo de Deus, há imensos dias marcantes na vida de todos aqueles que quiseram fazer brilhar a sua luz no meio dos homens. O dia em que Abraão deixou a sua terra para encontrar a Terra Maior, o dia em que Moisés descobriu que pertencia a um Deus infinito, o dia em que Maria sentiu que o seu filho tinha qualquer coisa de especial, o dia em que Jesus deixou a sua casa para iniciar a sua grande viagem, o dia em que Pedro começou a seguir Jesus, o dia em que as mulheres chorosas foram ao sepulcro e de lá vieram a cantar. Dias de luz, de decisão, de caminho. O dia em que Chiara Lubich não acompanhou os pais e escolheu ficar numa cidade destruída. O dia em que o irmão Roger se deixou encantar por aquela pequena e simples aldeia no sul de França. O dia em que Nelson Mandela se tornou um homem livre para lutar pela liberdade dos outros. O dia em que Jorge Bergoglio se apercebeu que já não voltava para a sua amada Argentina. Em Deus há sempre dias novos, dias de mudança. Não é preciso que estejam marcados num calendário, apenas é preciso que estes estejam marcados nas escolhas que fazemos e sabemos fazer a cada dia que é nosso e que nos pertence. Não é preciso esperarmos por um dia especial nem por nada de extraordinário para deixarmos que o melhor aconteça em nós. O que é fundamental é estarmos disponíveis, atentos, com o coração aberto. Deixarmos fluir e ouvir o que Deus tem para nos dizer, Ele que nos fala de tantos modos e formas através de tudo e de tanto que nos rodeia.
No domingo de Páscoa, o dia maior dos Cristãos, celebramos precisamente esse dia primeiro e cantamos alegre e jubilosamente, com o salmista, “Este é o dia que fez o Senhor. Nele exultemos e nos alegremos.” Acreditamos que o Senhor faz todos estes dias para nós, acreditamos que nos é dada a oportunidade de fazer de cada dia um dia grande, grato, maior. Cada dia que nos é dado para viver é sempre uma possibilidade e se é uma possibilidade é a vida a acontecer. É uma tarefa diária e constante a de cuidarmos dos nossos dias. Mesmo quando esses dias amanhecem cinzentos, chuvosos, cansativos, tristes. A vida é feita destas turbulências que tantas e tantas vezes nos servem de plataforma de lançamento para dias maiores, imensamente claros e luminosos. Vivamos, então, todos os dias com a certeza de que há sempre uma possibilidade, uma oportunidade, um caminho. Agradeçamos cada dia, cada momento, cada partilha. Todos os dias a vida terrena nos lembra que é efémera. E todos os dias podemos lembrar a maravilha que é viver cada dia. Em simplicidade. Em gratidão. Em espanto. Procuremos a essencialidade da vida naquilo que a vida nos dá. Não nos gastemos em rancores, incompreensões, maledicências. Busquemos o que é bom, o que nos faz bem, o que nos ilumina. E em cada dia saibamos fazer estas escolhas.
Gosto de setembro. Dos dias novos que vão chegar. Dos projetos de um futuro maior. Das escolhas que todos faremos. Da paz e da serenidade que o silêncio nos traz. Dos livros que vamos ler. Das palavras que vamos cantar. Das perguntas que vão aparecer e das mudanças que surgem depois como resposta. Gosto dos dias que vou escolher e dos propósitos que serão o meu lema. Felizes dias novos. É preciso fazer de cada dia um domingo de Ressurreição, o primeiro dia da semana, o dia em que Jesus Vivo lembra a cada homem e a cada mulher que há uma Vida que não acaba aqui. Seguimos juntos!