Reflexão para o mês de Julho de 2022
“E agora, eis o que diz o Senhor, o que te criou, ó Jacob, o que te formou, ó Israel: “Nada temas, porque Eu te resgatei, e te chamei pelo teu nome.” (do 2.º Livro de Isaías 43, 1)
Texto de Ana Luísa Marafona, Comunidade Estrada Clara
Somos conhecidos pelo nosso nome. É a nossa primeira identificação, é nossa primeira definição. Somos o nome que nos deram, que para nós escolheram, que para nós desejaram que assim fosse. Apresentamo-nos com um nome que reúne, numa tão simples palavra, tudo aquilo que somos, expressamos, pensamos, vivemos. Ao longo dos anos, este nosso nome carrega uma história, emoções, experiências, alegrias e tristezas, descobertas e caminhos. Somos o nome que nos é. No Batismo, quando os nossos pais e padrinhos anunciam o nosso nome, este também passa a ser uma propriedade sagrada, um nome que passa a ter uma alma. O nome é um elemento de individualização da pessoa na sociedade. Quer o apreciemos ou não, ele é o nosso património. O nosso nome próprio está relacionado com a nossa realidade pessoal e com a nossa identidade responsável, livre, criativa, identidade esta que vai sendo elaborada ao longo da nossa história pessoal. No nome de cada ser humano está tudo aquilo que nós somos. O nome é sempre a pessoa e interessar-se por saber o nome de alguém é procurar conhecer esse alguém. O nome é a porta de entrada de cada história particular. Quando um nome é invocado, ele traz consigo tudo o que a pessoa é, tudo o que ela significa, tudo o que ela simboliza. Há nomes que nos trazem alegria, saudade, que atualizam propósitos, que despertam compromissos, que reavivam sentimentos.
Também no universo bíblico, o nome de cada interveniente na história da salvação significa aquilo que torna cada pessoa única. São muitos os relatos dos chamamentos que Deus faz. É Deus quem toma a iniciativa e chama cada um dos seus pelo nome. O nome encerra assim toda a essência da pessoa e, ao mesmo tempo, todo o mistério da sua relação única e exclusiva com Deus. Deus chama-nos pelo nosso nome. O Senhor chamou Moisés pelo nome (Ex 3, 4), chamou Samuel pelo nome (1 Sm 3, 4). No livro de Isaías, sabemos que este chamamento vem desde o início da nossa criação: “Quando ainda estava no ventre materno, o Senhor chamou-me, quando ainda estava no seio da minha mãe, pronunciou o meu nome.” (Is 49, 1). Até as estrelas são conhecidas por Deus pelo seu nome: “Ele fixa o número das estrelas e chama a cada uma pelo seu nome.” (Sl 147, 4). Nos Evangelhos, acompanhamos o chamamento que Jesus faz a cada um dos seus discípulos, chamando-os pelo seu nome e dando a cada um a missão de colaborar na construção do seu reino de amor e de paz. No Evangelho segundo São João, no relato da parábola da ovelha perdida, ficamos a saber que o Bom Pastor chama as suas ovelhas cada uma pelo seu nome. Assim, há uma importância individual e única que nos é dada e que devemos assumir e na qual devemos acreditar.
E em cada dia, Deus continua a chamar-nos também a nós, nos nossos contextos, nas nossas rotinas, nas nossas escolhas. Deus chama pelo nosso nome. E Ele conhece mais do que o nosso nome. Ele conhece os nossos pensamentos, desejos, vontades, medos, alegrias. Ele conhece tudo em nós. Ter um nome significa que somos chamados, que há uma vocação à qual respondemos. E dentro das nossas possibilidades, da nossa originalidade, dos nossos limites e competências, somos chamados por Deus a concretizar essa mesma vocação, a dar um propósito e um significado à nossa existência. A sermos mais, a mostrarmos que somos filhos de um Deus que nos ama e que quer que escolhamos ser felizes. Sim, a escolha é nossa. Sempre nossa. Só nossa. Deus conhece-nos, sabe quem nós somos, mas criou-nos para a liberdade, para sermos nós a decidirmos o que queremos. Ele faz de nós seres de liberdade para que possamos escolher. Deus não nos impõe nada. Deus não nos obriga a nada. Deus não nos castiga nem se vingará de nós se não O quisermos escutar. Deus é amor. Deus é espera. Sou eu quem O escolhe. A dinâmica da nossa relação com Deus passa através da nossa história, dos nossos avanços e recuos, das nossas dúvidas e certezas, das nossas perguntas. Quando Deus nos chama para fazermos parte do seu projeto de amor, está a dar um significado novo ao nosso nome, ao nosso património existencial. Somos sempre chamados. É isso o que significa ter um nome. É ter dignidade, é ser um pedaço de infinito, é sermos únicos e sermos também imagem de Deus. Responder ao chamamento de Deus, nos dias de hoje, é assumir o nosso papel como filhos de Deus, é materializá-lo nas nossas escolhas diárias, é atualizar a sua mensagem de esperança e de amor nos nossos dias, é trazer para a minha rotina os gestos de Jesus, é abraçar a vida com coragem, é olhar quem me rodeia com compaixão, é escrever com as nossas atitudes os nossos novos evangelhos, é cantar eternos aleluias. E sabermos sempre que somos livres para construir o(s) sonho(s) que Deus tem para nós.
Deus continua a chamar-nos hoje. A todos. E chama-nos pelo nosso nome. Pela nossa identidade. Conhece-nos e privilegia a nossa individualidade. Não somos um aglomerado, um número. Somos ímpares. Somos únicos para Deus que nos ama precisamente por sermos irrepetíveis. O nosso nome é a nossa intimidade que é conhecida por Deus que é tudo em nós. Mesmo quando não O vemos, não O sentimos, não O desejamos. Ele faz-se presente e chama-nos a uma vida maior, plena, fecunda. Vem sempre ao nosso encontro mesmo quando não nos apercebemos disso. Por vezes, este nosso Deus chama-nos através de alguém que vem ao nosso encontro, outras vezes diz o nosso nome por meio de um acontecimento triste, muitas outras vezes interpela-nos através de uma canção que acabamos de ouvir, e tantas outras vezes, o nosso nome é dito pela natureza que estamos a contemplar. De muitos modos, Deus continua a chamar por nós. De forma criativa, atual, amorosa, Deus não desiste de nós. Quer nos dar uma vida nova, com significado, liberta da biologia redutora de todos os seres vivos. E este chamamento que Deus nos faz é plenamente concretizável – assim o aceitemos que seja – em qualquer contexto da nossa vida familiar, social, profissional, cívica. Podemos ser essas testemunhas de Deus nos momentos mais simples e com os recursos mais acessíveis que possuímos. Para isso só precisamos de escutar com o nosso coração o nosso nome. Aquele nome que Deus nos chama. E, sem medo e sem reservas, usemos a nossa vida para que o sonho de Deus se concretize através de nós. São Tomás de Aquino dizia que “cada pessoa é uma expressão singular de Deus.” Assim, cada um de nós sinta esta graça e esta responsabilidade de sermos esta singularidade de Deus nas nossas vidas. E assim seremos Luz. E assim seremos Paz. E assim seremos Páscoa!