V Domingo da Páscoa
Reconheces o caminho da esperança?
Haverá no Evangelho realidades que tornam a vida bela? Sim, há. Uma delas é a esperança. Ela permite ultrapassar o desânimo e também voltar a encontrar o gosto pela vida. E onde se encontra a fonte dessa esperança? Ela encontra-se na audácia de uma vida de comunhão com Deus. Mas como é possível essa comunhão? Deus amou-nos primeiro. Deus procura-nos incansavelmente, mesmo se não temos consciência disso.
Há uma outra realidade do Evangelho que torna a vida bela: a paz do coração. Sim, a paz do coração torna a vida bela para todos os que nos rodeiam. A confiança, a esperança e a paz do coração têm por fonte uma misteriosa presença: a presença de Cristo. Pelo Espírito Santo, ele permanece em cada um de nós.
Para quem procura abandonar-se em Cristo com um coração decidido e dar-lhe a sua vida, há uma decisão a tomar: deixar crescer em si uma gratidão infinita para com Deus. Essa gratidão dispõe-nos a viver em espírito de louvor.
Deus quer que sejamos felizes… E o que nos interpela é podermos avançar de descoberta em descoberta, de começo em começo. Consentir e aceitar as provações que, muitas vezes, fazem parte da vida humana… Procurar sempre a paz do coração. E assim a vida torna-se bela, a vida será bela!
Irmão Roger de Taizé in “Deus só pode amar”
Segunda-feira
A visão da vida
Ensina-nos, Senhor, a visão completa da vida.
Que não cessemos de saudar a cada dia o seu milagre assombroso e de o receber com coração humilde e consciente.
Que não cessemos de permanecer fascinados pela prodigiosa rede de amor que sustém o mundo: quanta prontidão, quanta resiliência, quanto dom, quanta esperança se ocultam invencíveis em gestos que se diriam frágeis, ou em contributos que apressadamente julgámos insuficientes.
Faz com que não nos tornemos profissionais da lamentação e do desânimo, mas testemunhas apaixonadas e poetas do real, que a cada instante se faz mais puro.
Que o isolamento do corpo nunca signifique isolamento da alma, mas o contrário: que se agigante, a alma, revelando a sua condição de transparência e de bondade, porque é por isso que Tu nos criaste.
Que não choremos apenas os abraços não dados, mas saibamos agradecer por todos aqueles que trocámos, cujo sentido e promessa esquecemos na distração dos dias.
Que não permaneçamos apenas a ruminar nos nossos passeios no bosque sempre adiados, ignorando que os bosques são encantadores mesmo quando ninguém os vê.
Por isso, pedimos-te que a nossa vida se assemelhe à sala de ensaios de uma companhia onde pacientemente se preparam os passos para o início da grande dança.
José Tolentino Mendonça in “Avvenire”
Terça-feira
O céu do sótão
«Experimenta também tu, uma vez que te sentires só ou infeliz ou triste, olhar para fora do sótão quando o tempo está tão bonito. Não as casas ou os tetos, mas o céu. Enquanto puderes olhar para o céu sem medos, estarás certo de seres puro por dentro e voltarás a ser feliz.» São palavras do “Diário” de Anne Frank.
Daquele sótão onde se consumiam os seus dias, a jovem vê uma fenda de céu e essa contemplação deixou de ser para ela uma experiência visiva, mas uma visão da alma. O céu consegue iluminar a interioridade e a fazer-lhe emergir a pureza e a bondade ocultas. Também a pessoa superficial, se se empenha por um instante a afastar-se do seu rebanho ou de um horizonte ameaçador e a procurar o céu, sinal da transcendência e do divino, descobre que tem ainda em si uma semente de luz, um rebento de bondade.
É nesse olhar para o infinito que podem desabrochar as conversões e pode reflorir, inclusive no desespero, a serenidade. Precisamente por isso, é necessário de vez em quando levantar a cabeça para o alto, estar em silêncio, descobrir o gosto da meditação, fazer aflorar uma oração. É só por este caminho que a graça divina surge e se irradia em nós, e a paz penetra no coração, fazendo-nos saborear a verdadeira alegria.
Cardeal Gianfranco Ravasi in “Avvenire”
Quarta-feira
A palavra seguinte
Deus acontece onde quer que nós amemos as pessoas, o nosso próximo. Jesus recusa-se a excluir seja quem for da categoria de “próximo”, não excluindo sequer os inimigos. Quando lhe perguntam quem devemos considerar nosso próximo, Ele inverte a questão, dizendo-nos: “Fazei de todos o vosso próximo.”
Quando nos perguntam quem é Deus e quem é o nosso próximo, não devemos dar uma resposta “pré-fabricada”. Devemos continuar sempre a procurar essa resposta e a experimentar como, nesse processo de busca, o horizonte de respostas possíveis se vai alargando continuamente. Derrubar a barreira entre Deus e os seres humanos também significa derrubar as barreiras entre as pessoas.
Estou convencido de que a “palavra seguinte” após a morte de Jesus, o regresso que, segundo os Evangelhos começou nessa manhã de Páscoa e que se cumprirá no fim dos tempos, é a descoberta do amor, do amor no sentido radical em que é utilizado no Evangelho: do amor como uma força incondicional e completamente abrangente de unificação com Deus e com todas as pessoas.
Tomáš Halík in “Quero que tu sejas! Podemos acreditar no Deus do Amor?”
Quinta-feira
Segue o teu caminho. Eu escolho seguir-te.
Ninguém pode deixar de ser livre. Cada um de nós é responsável, quase nunca pelo que lhe acontece, mas quase sempre pela forma como responde ao que lhe acontece. A vida é condicionada por muitos fatores, mas nunca há apenas uma opção! Cabe a cada um escolher o que julga ser mais importante.
Ser sábio não é saber muitas coisas, mas saber escolher. A verdadeira sabedoria é ser capaz de ver o bem e o mal e… ter forças para resistir ao mal e escolher o bem. Por isso, é essencial que tenhamos tempo para dialogar dentro de nós. Para desabafarmos com verdade e, com humildade, esperarmos pela resposta, sabendo que muitas vezes não a conseguimos escutar. O interior de cada um de nós é um mundo, onde acontecem grandes mudanças sem que nos apercebamos delas.
Importa confiar. Depositar a minha fé para além de mim. Lançar-me em busca de um abraço que não vejo, mas no qual acredito. E se correr mal? A vida é um constante risco de fracassos. Os seres livres, como nós, erram. Mas só alguns se deixam definir pelo falhanço. Outros, os que querem ser felizes, levantam-se e seguem para diante, apesar de tudo.
Amar é uma escolha e se amo dou o meu tempo, dou-me. Com generosidade e paciência. E quando há menos vontade, mantenho-me fiel ao meu compromisso. Porque se não fosse uma escolha, acabaria pouco depois e não teria mérito algum. Amar é colocarmo-nos atrás. Seguir.
José Luís Nunes Martins in www.agencia.ecclesia.pt
Sexta-feira
Água viva
Jesus oferece a todos os povos da terra a água viva que faz deles verdadeiros adoradores do Pai em espírito e verdade. Pelo seu ensinamento e pelo dom da sua vida, Cristo transmite-nos o pleno conhecimento de Deus e dos seus desígnios, conhecimento esse que culmina na partilha da vida.
Por Cristo, uma fonte de reconciliação verdadeiramente universal entra na história do nosso mundo. Sendo universal, esta fonte também é pessoal, pois penetra no coração de cada pessoa que vem ter com Jesus numa atitude de disponibilidade. Sendo interior, nem por isso é menos concreta, pois se exterioriza na vida da comunidade cristã na qual, dia após dia, homens e mulheres tentam viver a reconciliação no meio das eventualidades e das incompreensões da sociedade atual.
A partir de começos que parecem irrisórios aos nossos olhos de carne, Deus entra no mundo para o transformar de uma ponta à outra. Um encontro aparentemente insignificante junto de um poço da Samaria acaba por ser um facto repleto de consequências para o universo inteiro.
Irmão John de Taizé in “À beira da fonte – Jesus e a Samaritana”
Sábado
Nascer de novo
Enganam-se os que pensam que só se nasce uma vez. Para quem quiser ver, a vida está cheia de nascimentos.
Nascemos muitas vezes ao longo da infância, quando os olhos se abrem em espanto e alegria.
Nascemos nas viagens sem mapa que a juventude arrisca.
Nascemos na sementeira da vida adulta, entre invernos e primaveras, maturando a misteriosa transformação que coloca na haste a flor e dentro da flor o perfume do fruto.
Nascemos muitas vezes naquela idade avançada onde os trabalhos não cessam, mas se reconciliam com laços interiores e caminhos adiados.
Nascemos quando nos descobrimos amados e capazes de amar.
Nascemos no entusiasmo do riso e na noite de certas lágrimas.
Nascemos na prece e no dom.
Nascemos no perdão e no confronto.
Nascemos em silêncio ou iluminados por uma palavra.
Nascemos na tarefa e na partilha.
Nascemos nos gestos ou para lá dos gestos.
Nascemos dentro de nós e no coração de Deus.
José Tolentino Mendonça in “Rezar de olhos abertos”