José Tolentino Mendonça, O pequeno caminho das grandes perguntas, Quetzal Editores
Muitas vezes parecemos estar suspensos, à espera de um sinal espetacular qualquer para tomar uma decisão de vida sempre adiada. E queixamo-nos de falta de meios para levar a cabo essa transformação que vemos como necessária. Contudo, as verdadeiras transformações inventam os meios próprios para se expressarem, e estes, regra geral, começam por ser espantosamente modestos. Idealizamos de tal maneira o que pode ser a vida que ela arrisca-se a perder o jogo por falta de comparência, sequestrada num plano cada vez mais mental e abstrato. Ora, se não estamos dispostos a aprender com a sabedoria dos pequenos passos e com a dinâmica do provisório, dificilmente alcançaremos o que buscamos.
A história de Taizé é um bom exemplo: uma minúscula povoação que fica a 390 quilómetros a sudeste de Paris, sem nada de especial que a recomende, veio a tornar-se um dos pulmões espirituais da Europa. Em 1940, era apenas uma zona de demarcação entre a França ocupada pelas tropas alemãs e a França livre. Precisamente nesse ano, desembarcava naqueles nenhures um jovem teólogo suíço, Roger Schütz, transportado por uma pergunta, que não o largava: qual seria a sua missão, a que devia ele consagrar a sua vida? Um elemento curioso – e que se liga à espiritualidade do provisório, que escolherá como caminho – é que a primeira vez que ele chegou a Taizé, fê-lo de bicicleta (e pedalar desde Genebra). Poderia ser só um passeio ou uma fuga improvisada. Taizé era uma espécie de ponto zero, uma estação de passagem. mas ele entendeu esse nada como uma oportunidade para reparar as suas feridas e as da humanidade. E decidiu que ficaria ali.