No fim de semana 21 e 22 de maio, a Comunidade Estrada Clara orientou, na Quinta Juvenil dos Salesianos, no Porto, um retiro para o grupo ELOI, os jovens do 10.º ano da paróquia da Matriz (Póvoa de Varzim). Em preparação para o sacramento do Crisma, estes dias foram dedicados à descoberta do Projeto que Deus tem para cada um de nós, projeto este sempre único e irrepetível. Durante a manhã de sábado, houve lugar para um momento de oração, para a dinamização do tema “Escolhas” – a partir de um texto retirado do livro “Ética para um Jovem”, de Fernando Savater – e para um tempo de reflexão individual acerca das seguintes questões: o que foi e é mais fácil e mais difícil, para ti, nos teus processos de escolhas; de que modo os grupos em que vives (família, turma, igreja, desporto, música) refletem as tuas escolhas. Depois do almoço, o tema abordado “O Espírito que nos faz ser” foi um espaço privilegiado para se conhecer melhor o sacramento da Confirmação, com especial enlevo dado aos dons do Espírito Santo. Em seguida, os jovens formaram grupos onde trabalharam esses dons, o seu significado e o seu modo de atuar na vida de cada cristão. Depois do jantar, cada grupo apresentou os seus trabalhos e viveram-se momentos de muita criatividade, alegria e surpresa! No domingo, o retiro encerrou com a Eucaristia, animada pela Comunidade Estrada Clara com os jovens, e celebrada pelo pe Ruben Cruz.
A Comunidade Estrada Clara agradece, com muita gratidão, o convite das animadoras Mariana, Ciliana e Alexandra. Parabéns pela vossa entrega e dedicação a estes jovens ao longo de 4 anos tão exigentes. Agora, é hora do Futuro! Que juntos possamos continuar a fazer um caminho de Luz, de descoberta e de alegria n’Aquele que é tudo em nós!
No próximo domingo, estes jovens do grupo ELOI vão ser confirmados e recebidos na Igreja como cristãos em construção, em caminho. E isto porque o Sacramento da Confirmação não é o encerrar de uma etapa, mas sim o início de um caminho novo, de uma forma mais consciente e mais adulta de viver a fé cristã. Parabéns a este grupo pelas suas partilhas, pelas descobertas e pela alegria de acreditar neste Deus e em cada projeto seu.
O Jorge faz anos. Ele é toda a teimosia encarnada num metro e oitenta de altura, as gargalhadas vivas e duradouras espalhadas num corpo sempre moreno, o rosto barbudo e sério a encarar, com respeito, a grandiosidade da vida que acontece.
O Jorge faz anos. Ele é a música plena que envolve, as palavras cantadas e partilhadas em tantas e tantas vozes diferentes, a inquietação constante pelas notas a descobrir em cada canção.
O Jorge faz anos. Ele é a sensibilidade de um abraço forte que é sempre casa que acolhe, a ousadia de viver constantemente em alturas que ninguém suporta, a sorte grande deste encontro eterno que é o nosso.
O Jorge faz anos. Ele é caminho desafiante por entre subidas às altas montanhas e descidas até às águas frescas, uma conversa longa em altas horas, uma evangelização atrativa sem medos nem hesitações.
O Jorge faz anos. Ele é o verbo ir e seguir sem olhar para trás, o encantamento do silêncio no meio do ruído e da agitação, a procura incessante das estrelas mais brilhantes nas noites frias em São João.
O Jorge faz anos. Ele é a exigência de uma vida com sentido, a negação das futilidades ocas, a mão que se estende para que caminhemos à descoberta de quem somos.
O Jorge faz anos. Ele é o ataque de riso incontrolável nas nossas tantas viagens de carro, a psicologia humana e empática espiritualizada, todos os tantos livros aconchegados nas nossas estantes.
O Jorge faz anos. Ele é o azul de todas as roupas, as caminhadas pensativas dos entardeceres de Verão, as plantas que vivem em vasos mil.
O Jorge faz anos. Ele é o canto das crianças nas festas grandes das comunhões da Paróquia, as danças alegres dos nossos musicais nos palcos, os poemas profundos e interpelantes do seu querido Torga.
O Jorge faz anos. E hoje é um dia feliz. Muito feliz. Um dia de saudades inquietantes, mas de muito amor sereno a transbordar. Sempre. Sempre o amor que nos juntou, que se multiplica e que nos continua a levar por esta nossa Estrada Clara. Por tudo isto, seguimos. O maior presente deste aniversário fomos nós que o recebemos! Então, agora, é tempo de preparar a festa! Vamos! Viva a Vida! A Vida toda para toda a Vida!
Deixamos aqui os registos do terceiro encontro “Falar para CRER”, organizado pela paróquia da Matriz em colaboração com a Comunidade Estrada Clara. Este encontro aconteceu no dia 26 de abril e o tema foi “Maria, mãe de Deus – humanidade e divindade”. Com o propósito de preparamos, em comunidade, o mês mariano, neste terceiro encontro, fizemos a leitura trabalhada de uma homilia do papa Francisco, na qual ele nos apresenta Maria como figura humana e divina e, como tal, um exemplo para cada um de nós que com ela partilhamos a mesma humanidade e a essência divina que nos foi dada por Deus. Em seguida, como já vem sendo habitual, em pequenos grupos, os participantes do encontro foram convidados a refletir acerca de duas questões: de que forma a figura de Maria é, para mim, uma referência na minha caminhada cristã; em termos práticos, quais são as “pressas” que me movem na minha prática cristã. Por fim, em grande grupo, todos partilharam as suas reflexões.
Hoje teremos o quarto encontro “Falar para CRER”. Depois de um interregno de um mês no qual a paróquia esteve dedicada à celebração do mês mariano, regressamos com este espaço de partilha e de reflexão que é o “Falar para CRER”. Nestes encontros, partindo das vivências de cada cristão, refletimos acerca da atualidade da mensagem cristã e pensámo-la na vida concreta do dia-a-dia, fazendo-a acontecer em atitudes, em ações, em projetos. E em comunidade, em partilha, as ideias fluem de um modo mais construtivo e comum e vamos crescendo em conjunto, alicerçados numa fé trabalhada, adulta, esclarecida e, assim, mais próxima de um Deus que nos quer pessoas inteiras e sempre Ressuscitadas!
Os encontros “Falar para CRER” estão sempre abertos a todos os agentes da Pastoral (Catequistas, Jovens, Conselho Pastoral Paroquial, Leitores, Grupos Corais, Confrarias) das comunidades paroquiais. Não é necessária inscrição. 4.º Encontro “Falar para CRER” – 21 de junho de 2023 (4.ª feira), das 21h às 22h30, no Salão Paroquial da Matriz (Póvoa de Varzim)
📷Nota-se muito que este era um dos poemas preferidos do Jorge? Escrevia-o muitas vezes, em mensagens que enviava, em livros que oferecia, em listas de compras, em rascunhos, em faturas de contas para pagar. Devem estar a ser fascinantes as conversas entre estes dois (bem, se contarmos com os heterónimos serão muitos mais!). ⭐
Hoje celebramos os 135 anos de Fernando Pessoa.
Não somos Pessoa(s) sem a poesia pura, sem as palavras certeiras, sem as perguntas longas.
Não somos Pessoa(s) sem o futuro que nos acontece, sem os sonhos pedidos, sem as viagens vividas.
Não somos Pessoa(s) sem as inquietações persistentes, sem as interrogações constantes, sem as dúvidas hiperativas.
Não somos Pessoa(s) sem os rebanhos, sem as cidades em transformação e sem as horas de lazer.
Não somos Pessoa(s) sem os nossos sentidos, sem os pensamentos vibrantes e sem as luzes brilhantes.
Não somos Pessoa(s) sem as mensagens, sem o Quinto Império e até sem o Nevoeiro.
Não somos Pessoa(s) sem os nossos deuses diários, sem a criação magnífica, sem os aniversários por celebrar.
Não somos Pessoa(s) sem o desassossego, sem a nostalgia e sem a realidade dos sentidos.
Não somos Pessoa(s) sem aquelas tardes demoradas de Verão, sem a liberdade de poder não cumprir um dever, sem a inteireza do que escolhemos.
Não somos Pessoa(s) sem os cansaços acumulados, sem as frustações angustiantes, sem o arrebatamento da natureza.
Não somos Pessoa(s) sem os exageros imensos do sentir, sem a Lídia que connosco se senta a contemplar a vida, sem aquelas máquinas que quando precisamos nem sempre funcionam.
Não somos Pessoa(s) sem o nosso Mar salgado, sem o sebastianismo português, sem as horas de regresso à vida que nos acontece.
Hoje celebramos Pessoa. Hoje celebramos isto de sermos Pessoa(s). Hoje somos mais porque escolhemos ser imensos na Luz que escolhemos dar. Hoje somos mais felizes porque deixamos que esta Luz brilhe. No nosso Pessoa. Nas nossas Pessoa(s).
Viva Fernando Pessoa! Viva a Vida! Viva as Pessoas que vivem em nós. Sempre e para sempre!
Texto de Ana Luísa Marafona, Comunidade Estrada Clara
“Confia no Senhor, põe nele a tua esperança” (Salmo 37)
Para o padre Avelino, para a Rute e para a Sofia. Abraço-vos com este texto.
A semana passada foi dura, terrena, perturbadora. Um meu amado irmão de coração recebeu a dolorosa notícia da partida do Pai para a Eternidade. Uma estimada irmã na nossa comunidade soube que o Pai está a viver os seus últimos dias terrenos. Uma outra querida amiga está a viver uma situação difícil causada pela descoberta recente da doença da Mãe. Eu, que me julgava já doutorada em sofrimento e morte, senti-me abalada por estes acontecimentos. Há uma identificação e empatia imediatas. Encontro nas palavras destes meus amigos tantas das minhas próprias palavras. Vejo nos seus gestos de dor aqueles que foram os meus próprios gestos. Nas suas lágrimas o meu choro. Nas suas incompreensões as minhas questões. Nas suas dúvidas as minhas incertezas.
O sofrimento daqueles que amamos é, sem dúvida, a maior das nossas provações. A nossa resiliência, a nossa esperança, as nossas crenças são colocadas à prova. Vivemos a impotência, a incompreensão, a injustiça. Não é fácil passarmos a habitar em circunstâncias cruas e dolorosas e a ter de reconstruir projetos que até então julgávamos inabaláveis. Não se fica a mesma pessoa depois de experimentarmos a doença e a morte de quem amamos. Deixamos de saber como se contam os dias, os meses e os anos a partir de então, durante algum tempo passa-se a viver numa dimensão paralela, passamos a conviver com medicamentos e receitas, as tarefas práticas do dia-a-dia não se importam com a nossa vontade de quietude e passa-se a olhar para o mundo com um sentimento de desapego e de efemeridade. Mas é precisamente neste buraco negro de dor que Deus aparece para nos levantar. Parece contraditório, mas se nesses momentos de maior dor procurarmos este Deus que nos ama, acabamos por sentir uma força que é claramente inexplicável aos olhos humanos. No meio da morte, a vida é sempre mais. Sempre! Mais forte, mais soberana, mais dominante. A vida continua a fluir e é possível viver esta força de Deus mesmo quando tudo à nossa volta parece ruir. Parece ser algo paradoxal, mas esses tempos duros que atravessamos vão permitir a reconstrução de quem seremos. O cuidado, a atenção, as preocupações reescrevem a nossa história de Amor.
Por isso, ter fé num Deus não nos liberta de preocupações, não nos poupa a situações difíceis, não nos aplana o caminho. Acreditar num Deus não nos resolve todas as questões, não nos livra das incertezas, não nos torna imunes ao sofrimento. Para quê então acreditar? Eu acredito porque seria inconcebível uma vida que fosse por si só limitada a um tempo e a um espaço. Eu acredito porque o Amor que sinto por aqueles que são meus é demasiado grande para não poder ser eterno e perdurar para além da morte. Eu acredito porque Deus continua a revelar-se de cada vez que eu o procuro nas palavras, na criação, na música, no encontro, na empatia, no espanto, na descoberta. Eu acredito porque, pela ressurreição de um Deus vivo, eu sei que Ele me espera numa Eternidade feliz. Eu acredito porque todo o sofrimento, dor e incompreensão que todos nós vivemos não têm a última palavra. Eu acredito porque só é possível viver assim.
O confronto com a finitude (nossa e dos outros) também nos impele a viver mais, a agradecer mais, a ser mais. A viver o presente que é o presente de cada dia. A bendizer o passado e a projetar o futuro. A não lamentar o que aconteceu e a não criar expetativas futuras ilusórias. Viver o presente do presente. Não podemos evitar a dor da morte e o sofrimento naturalmente inerente a estas tragédias. Mas podemos confiar. Acreditar. O Amor não morre. Vive em cada um de nós que o aceitamos. Vive quando escolhemos ser Luz!
Quem ama, sente. Chora. Entristece-se. Vive a dor dura e crua. Questiona-se. Mas quem ama, também acredita. Mesmo quando nada se vê. Quem se deixa levar pelo Amor, vê tudo. Porque o Amor vence tudo o que é limitado, confuso, incongruente. Porque o Amor é sempre mais forte do que todas as nossas incompreensões, interrogações, frustrações. Por isso, não nos deixemos ficar no desespero, na tristeza, na apatia. “O desânimo, o cansaço, a fatalidade, a desesperança, a desistência, isso não pode triunfar no teu coração” (Cardeal José Tolentino Mendonça in Homilia na Vigília Pascal). Ser cristão é confiar que, mesmo nas situações mais dramáticas da nossa existência, nós nunca estamos sozinhos. E confiar implica sempre querer ver o que não se vê para então se poder ver.
A dor não se ultrapassa porque não se trata de nenhum campeonato. A dor não se vence porque não se trata de nenhuma luta. Não há aqui um processo de vencedores nem vencido. A dor atravessa-se porque faz caminho connosco. A dor enfrenta-se porque a colocamos à nossa frente para poder transformá-la. Guardar rancores, lutos, sofrimentos durante muito tempo só tem como resultado um coração pesado, amargurado, duro. A dor acontece para ser reconstruída em algo maior, sereno, apaziguador. E embora seja um processo difícil, é um acontecimento possível e necessário para nos salvar. Só assim a dor nos salva, se lhe atribuirmos um significado que nos projete no futuro, que nos faça viver.
Como cristãos que somos temos de assumir o que somos, a nossa essência, a nossa identidade, o entendimento da vida enquanto passagem para uma vida maior. Como cristãos que somos, procuremos em nós essa esperança que nos faz seguir viagem por mais conturbadas que as circunstâncias possam ser. Como cristãos que somos, entreguemo-nos nas mãos e no coração de um Deus que só nos quer bem. Como cristãos que somos, sejamos ousados em testemunhar que só podemos viver a e na esperança! A esperança cristã não é um sentimento infantil, momentâneo, automático naquele sentido em que se diz, em qualquer circunstância e tantas vezes de forma leviana, “vai correr tudo bem”. A esperança não ignora o enigma e o absurdo da existência, mas antes integra em si a própria desesperança. A esperança cristã é a certeza de que, aconteça o que acontecer, há um Deus que nos acompanha e que, por isso, a vida que nos é dada viver é sempre maior! A esperança cristã entra, muitas vezes, em contradição com a realidade que nos rodeia porque a própria mensagem de Jesus Cristo é fonte de contradição para um mundo que se apresenta como terreno, limitado, egoísta, calculista e esquemático. A esperança cristã é um encorajamento dirigido a cada um de nós no meio das adversidades. É um desafio a transcendermos a nossa própria existência e a abrirmo-nos ao cuidado de Deus. Somos peregrinos de mãos vazias, mas de olhos erguidos para o Alto, vivendo esta esperança que nos libertará das nossas dúvidas, medos, ansiedades. A esperança cristã não se baseia em garantias, mas exige dos cristãos uma verdadeira radicalidade.
Ser cristão é exigente porque sou chamado a trabalhar-me, a ir por caminhos por onde a maioria não vai, a ver com outros olhos uma realidade tantas vezes árdua e incompreensível. Mas ser cristão também é termos consciência do privilégio que é vivermos uma dor acompanhada por um Deus que nos abraça. Não somos fruto do acaso. Não somos acidentes de percurso. Não somos percalços da natureza. Somos, desde toda a eternidade, seres únicos na sua individualidade e amados por Deus. Tudo o que somos, o que escolhemos, o que nos acontece, o que experimentamos, o que rejeitamos, o que aceitamos faz parte da nossa identidade, da nossa história. O modo como eu lido com o que me acontece é o que me constrói. Por isso, como cristão, quero escolher ver e viver com esperança. Como cristão quero encontrar Deus nos momentos bons e menos bons da minha existência. Deus precisa do nosso testemunho de cristãos nas nossas circunstâncias mais desafiadoras, mais rigorosas, mais exigentes. É nesses momentos que Ele está mais presente e é, muitas vezes, aí que o podemos anunciar ao mundo com mais verdade, com mais plenitude, com mais concretude. Nos meses seguintes à morte do Jorge, enquanto eu e a minha comunidade nos íamos reconstruindo numa existência nova, numa das minhas meditações, surgiu-me a seguinte frase, que, hoje, muito a uso como oração diária: “Senhor, não sei o que me espera, mas sei que Tu me esperas sempre naquilo que eu não esperava.” Entreguemos a Deus tudo o que somos. Viver a esperança cristã não é não ter medo ou não o sentir. É antes aceitar essas dores e colocá-las nas mãos de Deus. E esperar contra toda a esperança, como nos diz São Paulo numa das suas Cartas. O Filho de Deus fez-se Homem para nos acompanhar em tudo, até mesmo nas nossas sombras e medos. Na sua morte na cruz está toda a dor que cada um de nós experimenta. Não estamos sozinhos. Mesmo na mais profunda das tristezas, há sempre aquela Luz que não se apaga. Essa Luz tem um nome – Jesus. Essa Luz tem um rosto – os nossos próximos (família, amigos, comunidade). Essa Luz tem uma força intensa – a do Amor. Essa Luz tem uma duração plena – a da Eternidade. “Confia no Senhor, põe nele a tua esperança”.