A reflexão de João, discípulo de Jesus
(a partir do Evangelho do dia – Jo 13, 1-15)
Recordo aquela noite como se ainda estivesse a vivê-la. A mesa posta, o pão ainda quente, o vinho já servido, mas o que se preparava – sei-o agora – era mais do que uma ceia. Era um testemunho.
Pedro falava alto, contando as suas peripécias para conseguir comprar aquele pão a tempo da ceia. Tomé, sempre desconfiado, fazia-lhe muitas perguntas. Tiago e Filipe divertiam-se a imitar os dois. Todos nós nos riamos. Foi então que Jesus Se levantou. Com um gesto sereno, mas cheio de solenidade, tirou o manto. Pegou na toalha, atou-a à cintura, tal como um servo faria. E ajoelhou-Se diante de cada um de nós.
Eu vi Pedro hesitar, vi os olhos dos outros abrirem-se de espanto. E dentro de mim soavam perguntas: “Como podia Ele, o nosso Mestre, curvar-Se assim? Como podia Ele, o Deus feito carne, tocar com mãos tão limpas a poeira dos nossos pés?” Quando lavou os meus, não ousei falar. Não senti apenas água… senti graça e misericórdia. Era como se cada gota dissesse: “Deixa-Me purificar-te.”
Naquele gesto, Jesus revelou o que muitos nunca compreenderiam: que a verdadeira glória está em servir, que a maior luz é a que se abaixa para iluminar a escuridão. Porque naquele gesto, Ele não lavava apenas os pés. Lavava-nos o orgulho, a rigidez, a falsa ideia de grandeza. Lavava-nos os medos, os atalhos, as pressas de querermos ser os primeiros. E mostrava-nos que o amor verdadeiro é sempre serviço, é dádiva, é entrega. Ali Deus ajoelhou-se na nossa humanidade.
Mais tarde, no Calvário, quando o vi entregar-Se por nós, compreendi que aquele lava-pés era já um prenúncio da cruz: o Deus que Se inclina, que Se doa, que ama até ao fim.
Naquele lava-pés, entendi que ser amado por Jesus é também ser chamado a amar como Ele: de joelhos, com a toalha da humildade e o coração aberto. Naquele Seu gesto, também percebi que quem não aceita ser lavado, nunca será fonte.