Tempo de férias: tempo para olhar, ou melhor, para contemplar. Sim, porque habitualmente olhamos as pessoas ou as coisas, mas não as vemos. Não temos tempo para deter o olhar, habituado a responder ao estímulo de alguma coisa que o atrai de maneira repentina: um semáforo, um placar publicitário…
Ou então olhamos aquilo que nos é dito para olhar: os nossos olhos são atraídos por aquilo que foi pensado para nos seduzir, para chamar a nossa atenção, para acender o nosso desejo. Não é por acaso que, muitas vezes, constatamos «não vi, não me dei conta», só porque uma coisa não se impõe ao nosso olhar.
As férias são um tempo propício para exercitar o olhar: sobre uma praia ter os olhos abertos para o céu; deter-se a ver o mar que está sempre a mudar de cor e de forma; ver como uma formiga transporta uma migalha de pão; observar como é feita uma flor…
É assim que se aprende a “ver com o coração”, como aconselhava o Principezinho. Então, ao abrir os olhos do nosso coração, podemos dedicar-nos a contemplar, a ver em grande, e, por isso, a sentir em grande. Assim se começa a ver verdadeiramente aquilo que existe e vive ao nosso lado, ainda que muitas vezes não nos apercebamos; treinamo-nos a admirar e a acolher o inesperado, o que é desconhecido e diferente daquilo que pensamos.
As férias são também um tempo propício para exercitar-se a refletir sobre a própria vida. Também esta é uma operação não espontânea, árdua, mas é fundamental escutar as perguntas que nos habitam. Perguntas que não podem ser eludidas a não ser removendo-as, ou “distraindo-nos”, inebriando-nos de ativismo. Estes dias “vazios” são, antes, a ocasião para nos deixarmos habitar, com calma, pelas perguntas cruciais: como está a minha vida? Aonde cheguei? O que me falta?…
Schopenhauer anotava que «o homem é um animal metafísico», habilitado a colocar-se perguntas que vão para além do visível. O que quer dizer viver e morrer? O que significa amar verdadeiramente? O amor pode acabar? O ser humano é um animal capaz de colocar-se estas interrogações, porque quer interpretar a sua existência, e dela quer dar-se e dar razões. Não há respostas claras e certas? Não é por isso que tem de se interditar de escutar estas perguntas, pelo contrário!
É preciso, então, encontrar tempo para ficar a sós, no silêncio, e demorar-se nas perguntas que nos habitam. Se nunca fizermos este “trabalho”, arriscamo-nos a viver à superfície, sem estarmos conscientes, sem conseguir ler a nossa vida e a avaliá-la nas suas expetativas e nos seus fracassos. Os latinos diziam que cada ser humano amadurecido deve conseguir “habitare secum”, a habitar consigo, a escutar-se. Não é uma operação narcisista, mas um ato de verdade sobre si e sobre a relação com os outros. É uma necessidade para agarrar a própria vida nas mãos com um mínimo de lucidez, e assim aprender a amar-se a si e aos outros com inteligência e criatividade.
Nas férias, dêmos, por isso, tempo à reflexão, ao pensar. E a quem nos pergunta «o que estás a fazer?», respondamos: «Olho e penso». Rara mas extraordinária resposta!
Enzo Bianchi in Monastero di Bose