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A vida toda

Dia da Vida Consagrada – 2 de fevereiro

“A vida toda para toda a vida” foi o que dissemos os três, uns aos outros, há vinte anos, num dia bonito de Verão. Comprometemo-nos a fazer de cada dia nosso um dia de aleluia, um dia de luz que ilumina, um dia do evangelho do encontro.

“A vida toda para toda a vida” foi e continua a ser o que nos faz seguir caminho nesta Estrada escolhida e onde tanta gente boa faz também caminho connosco.

“A vida toda para toda a vida” é o mantra das nossas escolhas, decisões e perguntas, dos muitos avanços e também recuos que nos edificam sempre em busca e em procura do que somos e seremos.

“A vida toda para toda a vida” é um hino à amizade comprometida, ao amor comunitário, ao sonho de um Deus que nos eleva sempre.

“A vida toda para toda a vida” foi e é um convite à ousadia, ao fazer novas tantas e tantas coisas, à partilha do que somado se multiplica.

“A vida toda para toda a vida” é e sempre será a minha viagem com o Jorge e a Beatriz, uma viagem iniciada nesta vida terrena e que já é sonhada naquele que será o nosso dia de Páscoa eterna.

“A vida toda para toda a vida” é o nosso compromisso maior de todos os nossos sonhos, é esta nossa irmandade simultaneamente tão simples e tão rica.

Hoje é dia de agradecer esta minha e nossa escolha em comunidade.

Hoje é dia de poder dizer com a minha vida esta vida bonita que Deus me ofereceu e que me faz tão feliz.

Hoje é dia num dia em que nele cabe todo o meu e nosso sim.

“A vida toda para toda a vida”. Feliz Dia dos Consagrados!

Ana

Ser consagrado

Um testemunho escrito pela Beatriz

O papa Bento XVI diz-nos que ser consagrado significa “pertencer ao Senhor” e isso significa “arder com o seu amor incandescente, ser transformado pelo esplendor da sua beleza”.

Há muitos anos, fui surpreendida com o convite para formar comunidade com a Ana e o Jorge. Estávamos inseridos em vários projetos na nossa paróquia, passávamos muitas horas juntos, e, portanto, fazia sentido que partilhássemos também a mesma casa. Foram e continuam a ser anos de aprendizagem, de partilha, de construção pessoal e comunitária.

Hoje, mais do que nunca, as pessoas precisam de saber como ser cristãs no seu dia a dia. Depois da missa ao domingo, como posso ser testemunha de Jesus? Como posso ser luz para os outros no “mundo real”? Como pode a oração fazer parte natural do meu dia? O projeto que começámos há tantos anos pretende responder a estas questões. Para nós, é natural começar e acabar o dia com a oração. É natural que nos intervalos do trabalho, o nosso tempo seja preenchido com projetos de formação, ensaios, animação de eucaristias, mas também com partilha de testemunhos, de alegria, passeios e convívios… e em tudo isto somos testemunhas de Deus que é Amor e que arde nos nossos corações, transformando-nos.

Este caminho em comunidade que vive a fé na rotina diária tem sido uma contínua descoberta para mim. É na relação que me descubro, que cresço e ajudo a crescer, que vou sendo cada dia mais aquilo que Deus sonhou quando me sonhou! Ser consagrado é, realmente, pertencer ao Senhor! Isto que é dito de forma tão simples e tão bela é suposto passar para a nossa vida em cada circunstância, quando os dias são luminosos, mas também quando anoitece e parece que não encontramos sentido no que vivemos… A vida fica pobre e muito incompleta sem esta parte espiritual! Nós somos feitos de luz e para a Luz! Precisamos do transcendente para nos elevarmos a toda a altura que temos!

Em cada dia agradeço o convite que feito há anos. Agradeço a oração de cada dia. Agradeço poder falar de Deus ou simplesmente vivê-Lo em cada dia. Agradeço ter com quem partilhar este projeto. E agradeço a vida que tem mais sentido vivida com e para os outros… e com e para o Outro!

Ainda sobre as JMJ em Lisboa e algo mais…

Este domingo celebramos o 38.º Dia Mundial da Juventude. Ainda ressoam, nos corações de todos, os ecos da experiência da JMJ Lisboa em forma de imagens, textos, testemunhos de quem participou e que invadem neste fim de semana as redes sociais. A este propósito, e de um modo diferente, publicamos um testemunho do nosso André, um dos nossos irmãos nesta Comunidade Estrada Clara, num texto que reflete uma outra visão tão bonita de um Deus que se deixa experimentar por cada um de nós quando abrimos o nosso coração à VIDA!

𝗔𝗶𝗻𝗱𝗮 𝘀𝗼𝗯𝗿𝗲 𝗮𝘀 𝗝𝗠𝗝 𝗲𝗺 𝗟𝗶𝘀𝗯𝗼𝗮 𝗲 𝗮𝗹𝗴𝗼 𝗺𝗮𝗶𝘀 – texto de André Oliveira, Comunidade Estrada Clara

“Este ano não tive oportunidade de participar nas Jornadas apesar de elas até serem no que agora chamo de minha cidade. Em 2011, ter tido a oportunidade de ter ido a Madrid às Jornadas foi, sem dúvida, uma das melhores experiências que tive. Lembro-me de ficar arrebatado com a atmosfera que é de ter milhões de pessoas a viver e sentir o mesmo Amor. Poderá parecer engraçado, mas até uma simples chuva num descampado era um momento de alegria (para os que estavam presentes lembrar-se-ão da dança da chuva para ver se acalmava a tempestade).

Este ano, ouvi, várias vezes pela televisão, a pergunta “O que esperam das Jornadas”. Penso que não se pode esperar nada, mas tudo ao mesmo tempo. As Jornadas foram muito mais do que os ensinamentos nas paróquias, as orações nas igrejas, as missas, as visitas a museus e passeios pela cidade e os momentos de silêncio. Tudo momentos que nos acalentam e impulsionam para celebrar a nossa Fé.

Mas este ano não participei por opção e porque a vida me trouxe uma forma nova de viver o Amor de Cristo. Acredito que existam várias fases da nossa vivência com Deus. Umas mais entusiastas em que o exponente máximo será provavelmente as Jornadas, mas existe uma outra fase onde é a vivência com um novo ser que nos faz acreditar mais no Amor. A simplicidade de ter um bebé nos braços a adormecer enche-nos de tal forma de Amor que é inexplicável. Tal como muitos jovens encontram um novo entusiasmo quando vão às Jornadas, eu encontrei agora com a minha filha.”

Do crachá ao QR Code – uma jornada pelas Jornadas

A Beatriz escreveu um breve testemunho sobre sua participação nas Jornadas Mundiais da Juventude. As que se vão realizar em Lisboa serão as suas sextas Jornadas. E que caminho bonito foi este que a Beatriz foi fazendo ao longo destas Jornadas.

Santiago de Compostela (1989)

Fui pela primeira vez às Jornadas em 1989, em Santiago de Compostela. Ainda estava tudo a começar sendo que estas foram as quartas Jornadas a acontecer, e apenas as segundas fora de Roma. Estas Jornadas em Santiago duraram apenas um fim de semana, de 18 a 20 de agosto, e nela participaram 600 000 pessoas.

Lembro-me que o acolhimento ao Papa João Paulo II foi feito na praça em frente à Catedral. Nós ficamos alojados num colégio, e lembro-me de encarar tudo como um acampamento de fim de semana, tendo até levado um fogão de campanha, pequenino, onde cozinhamos a refeição mais simples que se possa imaginar: arroz branco com rodelas de chouriça … Ainda não existiam as senhas para as refeições, nem locais onde as ir levantar. Na altura não tinha grande noção do evento em que estava a participar. Fui com o grupo da paróquia do qual fazia parte na altura, andei com o grupo, subi ao monte do Gozo com o grupo e descemos, logo de seguida, em virtude de algumas pessoas do grupo sofrerem de problemas respiratórios e as condições no monte serem demasiado adversas para elas: muita terra no chão (onde é o lugar dela), mas também no ar e principalmente nas pessoas! Nada que me espante agora, após 5 Jornadas, mas, na altura, ia com um grupo e acompanhei-o sempre. Portanto, a noite da vigília com o Papa foi passada no Colégio, com muita ressonadela por parte das ditas pessoas com problemas respiratórios que trouxeram a terra do monte Gozo nos seus narizes… Uns anos depois, numa viagem a Santiago de Compostela, um dos artigos à venda nas lojas para turistas era um saquinho com terra do monte do Gozo …!!!

Assim sendo, no domingo, assistimos à missa pela televisão, e mal os peregrinos portugueses que haviam pernoitado no monte chegaram, o autocarro partiu de regresso a casa …. Dentro vinham pessoas muito lavadas e pessoas completamente negras de pó! Foram uma Jornadas sui generis, mas ficou qualquer coisa.

Paris (1997)

As minhas segundas Jornadas foram em Paris, em 1997. Tinha acabado de sair de uma situação profissional e estava “entre empregos”. E o que faz uma pessoa que está à procura de trabalho? … Inscreve-se nas Jornadas, claro! Fomos um pequeno grupo de quatro pessoas: eu, a minha irmã, e dois amigos. Inscrevemo-nos através da Comunidade Emanuel, e isso foi um acaso feliz, que influenciou muito do caminho que fizemos depois. A Comunidade Emanuel tinha, e tem, por costume realizar umas pré-Jornadas, habitualmente em Paray le Monial. Foi a primeira vez que lá fui e fiquei maravilhada. Paray é a cidade onde o Sagrado Coração de Jesus apareceu a Santa Margarida Maria, e toda a cidade vive em torno desse acontecimento. Tem uma Basílica lindíssima, e uns prados onde a Comunidade Emanuel realiza diversos encontros: para adolescentes, para jovens, para adultos, para casais, para sacerdotes … As pré-jornadas decorrem ao longo de quase uma semana, com oração, concertos, workshops, adoração e, principalmente, muita animação musical. Paray funciona como ponto de encontro, nas Jornadas, para os diversos núcleos da Comunidade Emanuel espalhados por França e, no final da semana, todos se dirigem, em caravana, para Paris.

Em Paris, ficamos alojados numa família francesa, que nos acolheu com muito carinho, cedeu-nos o quarto dos filhos e, todas as noites, esperavam por nós para uma pequena conversa antes de dormirmos. Tenho recordações de muita gente (na celebração final estavam 1 200 000 pessoas), muitas bandeiras, muitos espetáculos, muitas caminhadas, muita alegria e muitos sorrisos. A celebração final foi no Hipódromo de Longchamp, na qual participamos e da qual regressamos entusiasmados pelo convite do papa João Paulo II a não termos medo de ser “os santos do novo milénio”.

Roma (2000)

A experiência foi tão boa que entusiasmei outros amigos a participarem nas Jornadas de Roma, no ano 2000, de novo com a Comunidade Emanuel, para poder regressar a Paray e repetir a experiência da internacionalidade e comunidade das Jornadas. Estas Jornadas coincidiram com o Jubileu, que incluía a passagem pela Porta Santa na Basílica de São Pedro. Lembro-me da fila interminável para lá chegar e da frustração acompanhada por muito riso, quando a fila em que íamos passou, não pela porta principal, mas por uma ao lado… Roma ficou-me no coração como uma cidade lindíssima, onde em qualquer rua ou esquina encontrávamos lugares que valia a pena visitar. Ficamos alojados numa paróquia que nos acolheu com muito carinho, com um pároco que acompanhava a celebração da Eucaristia à guitarra, e que nos acompanhou todo o caminho para Tor Vergata a tocar, acompanhado pelos cânticos dos jovens paroquianos. Estiveram presentes 2 000 000 pessoas na vigília. Lembro-me do calor e do regresso a casa com regadelas por parte das pessoas nas casas por onde passávamos, e da oferta de fatias de melancia para refrescar. Ficou a alegria e o carinho do povo italiano.

Colónia (2005)

Em 2005 decidimos ir a Colónia com os nossos jovens, ainda através da Comunidade Emanuel, mas agora com transporte próprio. Fizemos mais uma vez as pré-jornadas em Paray, cidade que me ficou no coração desde as Jornadas de Paris, e depois seguimos para Colónia em caravana com os grupos da Comunidade Emanuel.

A Alemanha foi uma surpresa muito agradável para mim. Tinha uma ideia de os alemães serem pessoas rígidas e pouco empáticas, e foi com muito agrado que vi o seu perfeito oposto. Ficámos alojados em Bergheim, em casas de famílias, que nos acolheram com muito carinho. Partilharam algumas refeições connosco e vi o que agora é comum em Portugal, mas não o era na altura: fazerem encomenda de gelado para entregar em casa no final da refeição … Onde estava a Glovo, Ubereats e outras que tal na altura! Colónia revelou-se uma cidade lindíssima, os polícias (com muitos metros de altura) muito atenciosos, a catedral maravilhosa e um povo muito acolhedor. Durante esta Jornada, participamos em vários eventos, visitamos lugares maravilhosos e vivemos cada experiência em comunidade. Foi uma Jornada em que muitos dos elementos do nosso grupo descobriram a sua veia mais artística, pois formou-se um grupo de animação de Metros e comboios, sempre pronto a atuar com cantos e danças! Mas também disponíveis para bater palmas a quem o fizer. A vigília foi em Marienfeld, já com o papa recém-eleito Bento XVI, onde participaram 1 200 000 pessoas. Estas Jornadas ficaram marcadas pela presença de dois Papas, João Paulo II recentemente falecido, e Bento XVI. Havia imagens dos dois Papas espalhadas por toda a cidade. Foi uma Jornada com dois Papas!

Madrid (2011)

Seis anos depois decidimos repetir a experiência, nas Jornadas de Madrid, em 2011, mais uma vez com autocarro próprio e com o nosso grupo de adolescentes e ainda com a Comunidade Emanuel. As pré-jornadas em que participamos foram em Toledo, apesar de também haver em Paray, por uma questão de logística. Toledo é uma cidade linda e tivemos a oportunidade de visitar a cidade antiga e de participar em inúmeras atividades.

Seguimos para Madrid e tivemos a sorte de ficar alojados num colégio mesmo no centro da cidade. Mais uma vez muitas pessoas, muitas bandeiras, muitas línguas, muitos sorrisos, muita alegria e muito calor! Passeamos, visitamos Museus, participamos em atividades das Jornadas, descansamos, rimos e cantamos. A vigília foi no aeroporto de Cuatro Vientos com o papa Bento XVI. Participaram 2 000 000 de pessoas. Foi uma vigília diferente das anteriores, muito molhada e ventosa, mas passada entre risos, gritos e muita agitação. Fiquei comovida com a preocupação que o Papa mostrou com os peregrinos, no dia seguinte, mal chegou ao local.

E assim considerei a minha participação nas Jornadas terminada. Fiquei de coração cheio com a experiência vivida, com a união na multiculturalidade, com o conhecimento de tantos países e de tantas pessoas, línguas, culturas, com a presença forte e atual da Igreja no mundo, com os sorrisos e abraços trocados … Gostei muito de ter participado, mas entendo que seja para a juventude, como o nome indica, por muitos e variados motivos, sendo um dos quais a disponibilidade para encarar alegremente, com generosidade e espírito aberto todas as situações que acompanham a Jornada em si: a deslocação para o país, o alojamento, a alimentação, a massa humana presente em todos os locais e a vigília no fim de semana de encerramento das Jornadas.

Gostei? Muito! Quero repetir? …….!

Então por que motivo vou à minha sexta Jornada?

Passo a explicar: temos um jovem amigo que se juntou ao nosso grupo há dois anos e nunca participou nas Jornadas!!!!! Com 25 anos!!! Não pode ser!!! Depois soubemos que outro nosso amigo também iria pela primeira vez. E como eu sou uma pessoa de comunidade…. Então decidimos ir!… De espírito aberto, com generosidade, alegremente, e com intenção de rirmos muito, de nós, dos outros e com os outros! Além disso, ainda me faltava uma Jornada com o Papa Francisco para encerrar a minha participação. E há um espírito de alegria, de entusiasmo, de movimento que só se sente nas Jornadas. Afinal, tenho muitos motivos para ir! E assim vou! Vamos! Apressadamente como Maria! Ou pelo menos o mais apressadamente que a minha provecta idade permitir!!!!!!

A vida toda para toda a Vida

Dia da Vida Consagrada.

Quando se pensa em “vida consagrada”, associa-se esta expressão ao estado mais comum, a vida sacerdotal ou religiosa. No entanto, a vida consagrada tem uma dimensão muito mais ampla. Ser consagrado/a significa dedicar a vida a uma Vida Maior, a um projeto de construção com os Outros por causa desse Outro que é o nosso Deus. Consagrar é tornar sagrado, assumir como relevante, rotular como importante. E esta noção de consagração envolve qualquer escolha de vida e significa sempre uma disponibilidade de coração, de pensamento, de confiança.  Há vinte anos, eu, o Jorge e a Beatriz fomos escolhendo (e digo escolhendo porque este é sempre um caminho que se vai fazendo) esta vida consagrada, dedicada à nossa Comunidade, ao nosso projeto de vida que é a nossa vida toda. Nunca nos guiamos pela ideia limitada que há, segundo a qual a vida em Igreja é só para os tempos livres, para quando é possível, para quando não há mais nada para fazer, para quando se é novo ou velho. Connosco acontecia o contrário, ou seja, tudo o que não acontecesse na Igreja (catequese, grupos de jovens, eucaristias, encontros, passeios, retiros, jornadas) não nos despertava muito interesse. Foi e continua a ser esta a nossa escolha, a de construirmos um projeto de vida cristã que tem como princípios a oração, a espiritualidade, a música, a cultura, o silêncio, o pensamento, o acolhimento, a partilha de ideias e o compromisso diário com uma Vida Maior. Os elementos que connosco partilham esta Estrada – e que são pais e mães, adultos e jovens – são testemunho desta proposta de vida cristã. Costumamos dizer que somos muito felizes com as escolhas que fazemos porque são as nossas escolhas. Nestes últimos dezassete anos, nós os três partilhamos uma vida em comum no espaço onde vivemos, rezamos, conversamos, choramos, sonhamos, sofremos e acreditamos. Por tudo isso, acreditamos que esta nossa vida comunitária poderá ser um incentivo para outras pequenas comunidades de vida em comum que existam em Igreja. “A vida toda para toda a vida”, foi o que prometemos os três num dia bonito de verão diante de um projeto de Vida. E assim continuamos. Feliz dia dos Consagrados!

Ana

A colina que subimos

A jovem poetisa americana Amanda Gorman declamou, de um modo luminoso, intenso e memorável, um poema da sua autoria na tomada de posse do novo presidente americano. Um poema que grita liberdade, que anuncia esperança, que canta um novo mundo, que celebra a vida que nasce depois do medo, da dor, da angústia. Todos nós temos esta colina prometida para subir e mais fortes somos quando a decidimos subir em conjunto, em comunidade e quando ousamos participar, intervir. Pois:

“Quando amanhecer, nós deixaremos a sombra,

ardentes e sem medo.

Uma nova madrugada floresce enquanto a libertamos.

Porque há sempre luz se formos suficientemente bravos para a ver,

se formos suficientemente bravos para o ser.”

A Colina que Subimos

A Colina que Subimos

“Quando amanhece nós perguntamo-nos:

‘Nesta interminável sombra, onde podemos encontrar a luz?’

‘Esta perda que carregamos, o mar que temos de cruzar’.

Nós enfrentamos a barriga da besta,

nós aprendemos que a quietude não é sempre paz.

E que as normas e noções do que é justo

nem sempre são justiça.

E, no entanto, o amanhecer é nosso num ápice,

de alguma forma conseguimos. De alguma forma resistimos

e vimos uma nação que não está quebrada, mas apenas inacabada.

Nós, os herdeiros de um país e de um tempo

em que uma pequena rapariga Negra, descendente de escravos

e criada por uma mãe solteira, pode sonhar ser presidente

e logo ver-se a declamar para um.

E, sim, estamos longe de ser polidos, longe de ser impolutos,

e isso não significa que estejamos a procurar formar uma união que seja perfeita.

Nós estamos a procurar erguer uma união com propósito.

Formar um país aberto a todas as culturas,

cores, caracteres e condições humanas.

E assim nós erguemos o olhar não para aquilo que nos separa,

mas para o que está diante de nós. Nós vemos o fosso fechar,

por sabermos que para colocar o nosso futuro em primeiro lugar

temos em primeiro lugar de colocar de lado as nossas diferenças.

Nós abandonamos as armas para darmos as mãos uns aos outros.

Nós não queremos mal para ninguém, mas harmonia para todos.

Deixemos o mundo, ao menos, dizer que isto é verdade:

que mesmo quando sofríamos, crescíamos;

que mesmo quando doía, tínhamos esperança;

que mesmo quando nos cansávamos, tentávamos;

que estaremos sempre juntos na vitória,

não por nunca voltarmos a sofrer derrota

mas por nunca voltarmos a semear divisão.

As escrituras dizem-nos para imaginarmos que ‘todos se sentem debaixo da sua própria vinha e figueira e que ninguém os faça recear.’

Se quisermos estar à altura do nosso tempo,

a vitória não estará na lâmina da destruição

mas em todas as pontes em construção.

Esta é a prometida clareira,

a colina que nós subimos se isso ousarmos,

porque ser Americano

é mais do que um orgulho que herdamos –

é o passado em que mergulhamos e a forma como o reparamos.

Nós vimos uma força que fragmentaria a nossa nação

em vez de a partilhar,

que destruiria o nosso país se adiasse a democracia.

E quase conseguiram.

Mas se a democracia pode às vezes ser adiada,

não pode nunca ser permanentemente derrotada.

Confiamos nesta verdade, nesta fé

porque quando pomos os olhos no futuro

o futuro põe os olhos em nós.

Esta é a era da justa redenção.

Receámos no início.

Não nos sentíamos preparados para ser os herdeiros de tão aterradora hora

mas no seu seio descobrimos o poder

de escrever um novo capítulo, de nos oferecermos confiança e riso.

Assim, enquanto outrora perguntávamos ‘como podemos vencer a catástrofe’,

agora dizemos: ‘como pode a catástrofe alguma vez vencer-nos?’

Não vamos marchar de regresso ao que foi, mas avançar para o que deve ser:

um país que está ferido, mas inteiro,

benevolente, mas audaz, forte e livre.

Nós não recuaremos ou nos deteremos

ante a intimidação porque sabemos que a nossa inação

e inércia serão o legado da próxima geração.

Os nossos erros serão os seus encargos

mas uma coisa é certa:

 Se juntarmos perdão com poder, e poder com retidão,

 então o amor torna-se a nossa herança

 e a mudança um direito inato das nossas crianças.

Vamos, pois, deixar um país melhor do que aquele que nos deixaram.

Com cada fôlego do meu peito cinzelado a bronze,

nós transformaremos este mundo ferido num mundo maravilhoso.

Ressurgiremos das colinas douradas do Oeste,

ressurgiremos do Noroeste varrido pelos ventos,

onde os nossos antepassados começaram a revolução.

Ressurgiremos das cidades à beira dos lagos dos estados do Midwest.

Ressurgiremos do Sul banhado pelo sol.

Nós reconstruiremos, reconciliaremos e recuperaremos todos os recantos conhecidos da nossa nação

e em cada canto que chamamos nosso país, o nosso povo diverso e belo surgirá fustigado e belo.

Quando amanhecer, nós deixaremos a sombra,

ardentes e sem medo.

Uma nova madrugada floresce enquanto a libertamos.

Porque há sempre luz se formos suficientemente bravos para a ver,

se formos suficientemente bravos para o ser.”