Isabel Leal, psicóloga, CARAS, 28.1.2107
Vamos percorrendo o nosso caminho, cruzando pessoas e acontecimentos, estabelecendo relações e, também, sofrendo desilusões. Quem nunca se desiludiu com alguém que julgava conhecer muito bem? Pode ter sido a propósito de amigos, considerados do peito, que um dia mostraram inveja ou ciúme, ou se descobriu que foram, para lá de inconvenientes, especialmente maledicentes, traíram uma confidência ou um segredo, ou, descaradamente tomaram o partido de quem considerávamos como adversários ou inimigos. Ou então foi o familiar próximo que em fase de partilhas se abotoou ao que não era dele, reinvindicando o que não tinha direito, dispôs de tudo à revelia dos outros. Quem nunca ouviu contar, lhe aconteceu ou teve por perto casais recém-casados que de pessoas vulgares e bem formadas se transformaram em poços de mesquinhez, capazes de agressividade absurdas e atitudes até aí inimagináveis? Quem nunca se sentiu humilhados, desapoiado ou ignorado pelas pessoas de quem se esperava exatamente o contrário?
Frequentemente ao longo da vida experimentamos situações que nos obrigam a pensar o quão bem conhecemos as pessoas que fazem parte da nossa vida. Concluímos sempre que afinal as conhecíamos mal, não entrando em linha de conta com as nossas expectativas sobre elas. Se ponderarmos um pouco mais, no entanto, somos capazes de concordar que os amigos que se viraram contra nós já o tinham feito em relação a outros, que o irmão com quem discutíamos partilhas sempre foi ganancioso ou se sentiu com direitos especiais, que o ex-cônjuge que agora não reconhecemos já tinha demonstrado noutros aspectos da vida as mesmas características vingativas ou obessivas, que os pais, os filhos, ou os amigos que num dado momentos nos criticam sempre foram demonstrando as usas opiniões sobre o que era melhor para nós e, por isso, devíamos ser ou fazer.
A questão do conhecimento que temos dos outros é sempre minorada pelos afetos que lhes dedicamos e, nesse sentido, achamos que, sejam eles como forem, connosco são diferentes. Esquecemos que os afetos mudam mais rapidamente que as pessoas, daí o confronto frequentemente entre as nossas expectativas e a realidade que, bem vista, sempre lá esteve.
Para o bem e para o mal, só vemos mesmo o que queremos ver.