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Cristo Rei

maxresdefaultpe. Vitor Gonçalves, pároco de S. Domingos – Lisboa, Voz da Verdade, 20.11.2016

“Se és o Rei dos judeus, salva-Te a Ti mesmo.”Lc 23, 37

“Senhor, que eu possa trazer mais um!…” Esta é a prece de Desmond Doss, o protagonista de “O Herói de Hacksaw Ridge”, o novo filme de Mel Gibson, no meio da sangrenta batalha de Okinawa. Trata-se da história real deste objector de consciência que participou na II guerra mundial, sem pegar em nenhuma arma, e nessa batalha tratou e salvou 75 camaradas feridos tirando-os da frente de batalha. Foi o único soldado condecorado pelos Estados Unidos sem ter disparado um tiro e recusou até à sua morte (em 2006) que se fizessem filmes sobre ele. Mel Gibson, num retrato violentíssimo sobre a guerra, descreve o seu exemplo de fé e determinação: “Quero ir à guerra para salvar os que puder!” diz a dada altura do filme Desmond Moss.

Perante toda a espécie de violência nem sempre pensamos as nossas reações. Luta, fuga, medo, vergonha, desespero, indignação… tudo é possível. Sabemos que a natureza comporta violência: as estrelas explodem, os planetas colidem, há terramotos e vulcões, tempestades e secas, e tudo parece fazer parte da vida em transformação. Que bom termo-nos libertado das ideias (talvez alguns ainda não!) de deus ou deuses vingativos com os desvarios da humanidade, a enviar cataclismos da natureza como castigo. Assim foi o triste exemplo de um padre italiano que afirmou serem os recentes terremotos no centro de Itália um castigo de Deus pelas “ofensas à família e à dignidade do casamento, em particular através das uniões civis dos casais gay”. Isto sim é violência gratuita e ofensiva!

É indescritível a violência de qualquer guerra e ainda recentemente o filme português “Cartas da Guerra” de Ivo M. Ferreira, baseado na correspondência do escritor António Lobo Antunes com a sua mulher, a mostrou com dureza e beleza. Não podemos fechar os olhos a tantas violências bem próximas de todos, mas o que marca verdadeiramente a diferença é o desejo de “salvar quantos pudermos”. Tão oposto ao “salva-te a ti mesmo” que Jesus crucificado ouve por três vezes. Os chefes, os soldados e um malfeitor, na violência do calvário, são porta-vozes da tentação começada no deserto: viver para si e por si, ser o centro do mundo, usar todo o poder em proveito próprio. Mas Jesus vive com o Pai e o Espírito Santo, e o seu amor é transbordante; quer chegar a todos, a mais um…, mais um…, sempre mais um. Assim, na cruz, Jesus promete o Paraíso ao mais inesperado dos pedintes, o ladrão “que roubou o paraíso”, como comentou S. João Crisóstomo, acrescentando: “Ó admirável malfeitor! Viste um homem crucificado, e proclamaste-o Deus!”

Culminamos o Ano da Misericórdia na festa da realeza de Cristo, o Deus connosco a “entrar” em todas as “guerras” humanas para salvar todos, e sempre “mais um”. Este “um” é cada um de nós e também os que encontramos em perigo. Não esqueçamos a feliz imagem do Papa Francisco a comparar a Igreja a um “hospital de campanha”: “Essa é a missão da Igreja: curar as feridas do coração, abrir portas, libertar e dizer que Deus é bom, que perdoa tudo, que é Pai, é terno e nos espera sempre.” Quantos continuam sem ouvir isto?

Não te cansas de ser sempre um lencinho?

índiceJosé Luís Peixoto, Em Teu Ventre

Não te cansas de ser sempre um lencinho?

Como me iria cansar, menina? Falta-me tudo para deixar de ser eu próprio. Mesmo que embarcasse nessa ilusão, nunca poderia imaginar ser outra coisa, não conseguia. Mesmo que me convencesse de que havia alternativa, que podia ser outro, aquilo que imaginasse não chegaria a ser diferente da minha espécie porque, no fundo, seria concebido pelos meus padrões, ideias e preconceitos.

Pensas demasiado, lencinho, complicas. Só te queria dizer que estou cansada de ser eu. Parece-me agora que gostava de ser outra coisa, talvez um lencinho, como tu, guardado no meu bolso, dobrado e morno.

Irias admirar-te com o tanto que te falta saber sobre a vida dos lenços. E, se estás cansada de ser tu, este é um momento tão bom com outro qualquer para abandonares essa imprudência. Cansa-te seja do que for, mas nunca te canses de ti porque, em toda a lonjura deste mundo, só tu podes ser essa pessoa que és e, se faltares, não há quem te possa substituir.

para glória do Seu nome

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agradecimento de Fernando Santos

“Em primeiro lugar e acima de tudo, quero agradecer a Deus Pai por este momento e tudo aquilo da minha vida. Quero deixar uma palavra ao especial ao presidente [Fernando Gomes, presidente da Federação Portuguesa de Futebol] pela confiança que sempre depositou em mim. Não esqueço que comecei com um castigo de oito jogos, a toda a direção e aos que viveram comigo estes meses. Aos jogadores, quero dizer mais uma vez que tenho enorme orgulho em ter sido seu treinador a estes e aqueles que não estiveram presentes, também é deles esta vitória.”

“A toda a direção e a todos os que viveram comigo estes meses. Aos jogadores, dizer mais uma vez que tenho um enorme orgulho em ter sido o seu treinador. A estes e aqueles que aqui não puderam estar presentes. Também é deles esta vitória. O meu desejo pessoal é ir para casa, dar um beijo do tamanho do mundo à minha mãe, mulher, filhos, ao meu neto, ao meu genro e minha nora e ao meu pai, que, junto de Deus, está seguramente a celebrar.

“A todos os amigos, muitos deles meus irmãos, um abraço muito apertado pelo apoio mas principalmente pela amizade. Por último, mas em primeiro, quero ir falar com o meu maior amigo e sua mãe, dedicar-Lhe esta conquista e agradecer por me ter convocado e agradecer por me ter concedido o dom da sabedoria, da perseverança e humildade para guiar esta equipa, com Ele a ter-me iluminado e guiado. Espero e desejo seja para glória de Seu nome.

Um coração maravilhoso

índiceCardeal Gianfranco Ravasi, Avvenire

«Acredito que um dia, o teu dia, meu Deus, avançarei para ti com passos titubeantes, com todas as minhas lágrimas na palma da mão, mas também com este coração maravilhoso que nos deste, este coração demasiado grande para nós porque é feito para ti.»

«Amarás o Senhor teu Deus com todo o coração…» Todos recordamos este apelo do Deuteronómio (6,5), o quinto livro da Bíblia. O Catecismo da Igreja Católica explica que «a tradição espiritual da Igreja incide também no coração no sentido bíblico de “fundo do ser” em que a pessoa se decide ou não por Deus» (n. 368).

O profeta Jeremias, por seu lado, estava certo de que Deus quer «escrever a sua lei no coração» dos homens (31,33). O “coração” não é reduzível, portanto, ao sentimento, mas é, na prática, a nossa consciência, a nossa alma, aberta ao infinito, ao eterno, ao mistério divino. É isto que exprime sugestivamente Jacques Leclerq (1891-1971), teólogo moral belga, precursor do Concílio Vaticano II, nas palavras intensas e espirituais que citámos acima.

Na Bíblia denuncia-se o coração «endurecido», quase petrificado, que não pode, por isso, dilatar-se a abraçar Deus, os grandes horizontes, o respiro da beleza e da verdade. Repete-se muitas vezes a célebre frase dos “Pensamentos” de Pascal: «O coração tem as suas razões que a razão não conhece» (n. 277). A vastidão e a liberdade da alma humana não se comprimem na, ainda que gloriosa, caixa craniana.

Diante de Cristo, «manso e humilde de coração», tomamos a oração de um conhecido escritor sueco, Pär Lagerkvist (1891-1974): «Tem-me, Senhor, com a tua mão misteriosa e não me abandones. Conduz-me sobre luminosas pontes que atravessam o vertiginoso abismo, onde reténs prisioneira a treva».

traduzido do italiano por Rui Jorge Martins, Pastoral da Cultura, 01.07.2016

Compromisso

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(…) até que uma pessoa se comprometa há hesitação, a hipótese de recuar, sempre a ineficácia. Relativamente a todos os atos de iniciativa (e criação), há uma verdade elementar cujo desconhecimento mata inúmeras ideias e planos esplêndidos: a partir do momento em que uma pessoa se compromete definitivamente, então a Providência também se mexe. Acontece toda a espécie de coisas para ajudar que, de outra maneira, nunca teriam ocorrido. Há uma série de acontecimentos que surgem da decisão, erguendo a nosso favor todo o tipo de incidentes imprevisíveis, de encontros e de assistência material, que ninguém poderia sonhar que viessem ter consigo. Aprendi a ter o mais profundo respeito por um dos dísticos de Goethe:
“Tudo o que possas, ou sonhar possas, começa. A ousadia tem génio, poder e magia em si.”

W. H. Murray, The Scottish Himalayan Expedition, 1951

Lo imperfecto

2001-jury-soledad-lorenzoSoledad Lorenzo, directora, Arquitectura y Diseño 177

La huella del tiempo sobre la piel de un mueble usado tantas veces, el pequeño defecto que hace exclusivo cualquier objeto hecho a mano, la luz que amarillea las hojas de los libros, la grieta silenciosa que surca la madera con los años… La perfección de lo imperfecto, de lo que es irrepetible y que se experimenta com más intensidad cuanto más tiempo lleva pegado a nuestra vida, como las personas que amamos.

Buscábamos en este número la definición de lo que es una casa “com alma”, esos espacios reconfortantes marcados por un halo especial y que los ingleses califican con un adjetivo intraducible, pero tan expresivo como es “cosy”.

Nos pusimos al habla com ocho profesionales que dedican sus días a crear lugares para la vida de los demás para que nos desvelaran su secreto. Todos nos hablaron de memoria, de esencia, de arrugas, de la biografia de los objetos, del calor de las historias.

En esse hilo invisible que a veces, de forma milagrosa, une el argumento de los temas que se ensamblan en el cuerpo de una revista llegó a nosotros un libro increíble sobre artesanos españoles y entendimos que reforzaba la reflexión de lo que la beleza se cobija en la diferencia y en el esmero por alcanzar algo especial. Y la acumulación de sus frutos a lo largo de una vida en el espácio de una casa genera algo mágico. Mejor cuanto más verdadero y vivido. Objetos, recuerdos, muebles, tejidos y materiales que han perdido ese algo aséptico y sin vida de lo que es nuevo, unidos por la pátina genial de haber sido disfrutados y contemplados tantas veces que ya no se parecen a ninguno de sus iguales.

Lo imperfecto es la vida. Por eso, aunque idealmente buscamos su contrario, en realidade lo amamos porque lo entendemos mejor y nos hace sentir en casa.