José Tolentino Mendonça na E do Expresso
(…) Esta nova forma de existência coloca-nos perante um animal laborans que é constrangido a explorar-se a si mesmo, mesmo quando não tem uma evidente constrição externa, tornando-se ao mesmo tempo vítima e carcereiro, explorado e explorador. O que o faz sofrer não é, por isso, que alguma coisa não seja possível de obter ou alcançar, mas que ele não seja capaz de abraçar, a toda a linha, o regime epocal novo que garante que nada é impossível. Como consequência, as patologias da sociedade de prestadores já não são do tipo bactérico ou viral, mas de tipo neuronal. Passou-se a viver num estado depressivo latente gerado, em grande medida, por esta sensação difusa de não estar a responder a tudo, a participar em tudo, a usufruir de todas as possibilidades acenadas. A depressão, o défice de atenção, a hiperatividade, o burnout, os distúrbios boderline de personalidade estão alinhados com este excesso de positividade em que infatigavelmente mergulhamos. Uma via de saída é, mais do que nunca, reaprender a fazer um bom uso do cansaço. vivemos um tempo que ignora o valor da interrupção, da pausa, do espaço intermédio ou do intervalo. (…)